Cisne Negro

Black Swan (No Brasil e em Portugal: Cisne Negro) é um filme de suspense e drama psicológico estadunidense dirigido por Darren Aronofsky e estrelado por Natalie Portman, Mila Kunis, Vincent Cassel, Barbara Hershey e Winona Ryder. Data de lançamento: 30 de novembro de 2010 (Nova Iorque).

Tenho visto com freqüência em Sociedades, Congressos, Núcleos, o filme Cisne Negro ser comentado. Penso que além de sua temática, o filme suscita interesse devido ao fato do diretor conseguir expressar em uma linguagem cinematográfica a vivência interna de emoções turbulentas vividas pelos personagens. Ele conseguiu entrelaçar as pressões externas de competição, rivalidade e inveja com as respostas possíveis de dentro de cada um. Não sabemos discernir com clareza enquanto assistimos ao filme, o que é alucinação, delírio ou realidade. Passada a desorientação podemos concluir que de forma impactante ele consegue “falar” por imagens a linguagem do inconsciente.

A trama do filme Cisne Negro gira em torno dos ensaios para apresentação de uma nova versão do Ballet “O Lago dos Cines” de Tchaikovsky. Nessa nova versão, a bailarina terá que ser capaz de interpretar Odete e Odile, o cisne Branco e o cisne Negro. Teria que encarnar o bem e o mal. O personagem Thomas Leroy vivido pelo ator Vicent Cassel aprova Nina (Natalie Portman) desempenhando o Cisne Branco – apenas. Para ser a primeira bailarina teria que ter o desempenho do Cisne Negro também. Ele quer alguém mais solto, com capacidade de seduzir e… destruir. Aí começa todo o desfile das emoções humanas mais primitivas e atormentadoras que os seres humanos possuem dentro de si. O que é fantástico nesse filme é a idéia que nenhum de nós pode desempenhar um só papel – o do mocinho ou do bandido. Um só dos dois, levaria uma pessoa ao fracasso e a destruição. Um pouco além dos dois o angelical ou o demoníaco levaria também a decadência. Qual a medida adequada? Qual o amalgama adequado para as duas faces que compõe essa moeda que é a mente humana.

O diretor Darren Aronofsky consegue colocar a questão do desafio do ser humano para se constituir tanto do ponto de vista do mundo interno da jovem que quer brilhar, como do mundo externo que é cruel, competitivo e exigente. Nina quer brilhar por causa de sua insegurança e despreparo, mas quer também brilhar para satisfazer a pressão da frustração materna que não conseguiu sucesso “por ter que abdicar da carreira para cuidar da filha”. Importante também lançar um olhar para a estrutura familiar dela. Junto da mãe, só as duas, a ausência masculina, o desejo de triunfo aparece como compensação do abandono paterno. Na relação tão delicada entre mãe e filha não sabemos o quanto essa ligação pode ser de proteção, de construção ou de destrutividade e ataque. Ao entrarmos no mundo de Nina, um mundo sufocado pela proteção materna, mergulhamos em tormentos psicológicos pela busca constante de superação e de perfeição. Nos deparamos num real alucinado – muitas cenas não sabemos se acontecem ou são as alucinações de Nina. Nem mesmo a cena final – Fica no ar se houve um suicídio ou houve uma alucinação também – Aparecem muitos sentimentos guardados prontos para explodir. O mundo interior de Nina é tão frágil quanto o mundo exterior – pueril e virgem, que desmorona com a aparição de suas obsessões e fantasias.

Cisne Negro atormenta ao mostrar, através do mundo do Ballet, sonhos, desejos reprimidos, emoções, atitudes sombrias. As interações tão agressivas fixam em nossas mentes, pois se encaixam e em várias situações nos fazem pensar no Branco e no Negro que tem dentro de cada um. A atuação do personagem de Cassel – o diretor coreógrafo que seduz e induz suas bailarinas a ultrapassarem seus limites é assustadora, pois trás uma pessoa fria que faz explodir emoções sem se importar com as conseqüências. Nina, mesmo tendo o papel já garantido, é obrigada a partir numa viagem angustiante onde um lado seu explode e toma conta dela. É o seu lado negro como o cisne que precisa interpretar. Cisne Negro trata do impulso violento e destrutivo que carrega a protagonista em direção a uma nova pessoa que ela não desconfiava ser e isso lhe custa a sanidade.

O espectador a acompanha sem fôlego em sua transformação nessa criatura escuro, sem limites e barreiras que toma o palco com suas penas e um olhar apaixonado injetado de vida e violência e um mundo a seus pés, em uma salva de palmas que só veio a custa da perda de todo o resto que lhe impedia de chegar ao último salto do Cisne Branco em busca da redenção.

No Dia 20 de fevereiro de 1877 estreou em Moscou no Teatro Bolshoi o balé “O lago dos cisnes” do compositor Tchaikovsky. Conta a história de uma princesa que é transformada em cisne recebendo esse destino por uma maldição e assim deve permanecer pelo resto de sua vida. Uma noite ela foi vista por um jovem príncipe enquanto dançava pela floresta. Ela dançava retornando em sua forma humana. Estava escuro e o escuro a protegia do feitiço. O príncipe se apaixona por ela e então ela lhe conta sua triste história. Odette –o cisne branco- tem uma irmã gêmea – Odile que é o cisne negro. Uma era boa e a outra má.

No final o príncipe e Odette se jogam num lago e se unem pela morte. O filme acaba sendo uma bela metáfora do “Lago dos Cisnes”.

Vemos a transformação de uma moça frágil em uma pessoa feroz e obstinada pela perfeição paranóica e má. Aparece na mesma personagem de Nina – Odette e Odile – que disputam o “amor” do príncipe. Os sentimentos destrutivos do cisne negro emergem em Nina que não quer mais suas aspirações infantis, mas que passa a viver em um cárcere de delírios e alucinações.

Depois de conviver com um objeto intrusivo e torturante Nina sente desejo de arrancá-lo de si. Quer se livrar da tirania. Não se sabe ao certo se no final Nina de fato morre em função de sua destrutividade ou se no final de sua apresentação ela conseguiu se libertar de uma Nina sufocada e reprimida. Metaforicamente o salto final poderia simbolizar sua redenção e liberdade. Talvez represente a luta de todo ser humano para se encontrar podendo ressaltar seus bons objetos, contar com eles e ao mesmo tempo aprender banir de dentro de si a ameaça de se ver cativo de sua própria destrutividade.

Trata-se de um filme que aborda principalmente a busca da identidade. Retrata muito bem como essa busca é dificultada pelos aspectos destrutivos que há na mente. Aborda também o fato de não podermos negar esse lado, pois se o fizéssemos correríamos o risco de nos tornarmos ingênuos. No filme vemos também como os conflitos familiares podem exercer total influência na busca da identidade que renova a cada dia.

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