Cidadão Kane
NÚCLEO DE PSICANÁLISE DE MARÍLIA E REGIÃO E ASSOCIAÇÃO PAULISTA DE MEDICINA DE MARÍLIA APRESENTAM O FILME: CIDADÃO KANE – (CITIZEN KANE, 2012)
CINE DEBATE – 01 de julho de 2017
Citizen Kane (no Brasil, Cidadão Kane) é um filme americano de 1941, dirigido, escrito, produzido e estrelado por Orson Welles. É considerada uma das obras-primas da história do cinema, sendo particularmente elogiado por sua inovação na música, fotografia e estrutura narrativa.
A história examina a vida e legado de Charles Foster Kane, um personagem interpretado por Welles e com base no magnata da imprensa William Randolph Hearst e do próprio Orson Welles. Narrado principalmente através de flashbacks, a história é contada por meio da investigação de um jornalista que quer saber o significado da última palavra que ele disse antes do magnata morrer: Rosebud.
Há algum consenso entre os críticos que Cidadão Kane é o melhor filme que já havia sido feito.
Conta a história de Charles Foster Kane, um menino pobre que acaba se tornando um dos homens mais ricos do mundo.
O filme inicia com a sua morte, momentos antes da qual pronuncia a palavra “Rosebud“. Após dias de sensacionalismo em cima da notícia de sua morte, o jornalista Jerry Thompson (William Alland) recebe o encargo de investigar a vida de Kane, a fim de descobrir o significado de sua última palavra (Rosebud). Entrevistando pessoas ligadas a Kane, o jornalista mergulha na vida de um homem solitário, que desde a infância é obrigado a seguir a vontade alheia. Ninguém a seu redor importa-se com Kane, que busca por meio da aquisição de bens a adoração das pessoas.
No entanto, como o filme termina, o público descobre o real significado de Rosebud: Tratava-se do trenó da infância de Kane – uma alusão á única fase de sua vida em que ele realmente foi feliz. O trenó, pensado ser lixo, é queimado em um forno pelas pessoas que estavam partindo de Xanadu.
Um grupo de jornalistas inicia, assim, uma investigação sobre a vida pessoal de Kane a fim de descobrir o significado da palavra. São os relatos dos velhos conhecidos da vida de Kane que levam o espectador a conhecer a história do empresário. O espectador tem conhecimento da vida de Kane através dos fragmentos de momentos de sua história, desde sua infância, quando morava com sua mãe em um humilde pensionato no interior, até seus últimos momentos em sua luxuosa e opulenta mansão.
É relatado que a mudança na vida pacata de Foster Kane ocorre subitamente, quando sua mãe recebe como pagamento de um pensionista as escrituras de uma mina supostamente sem valor. Mas o fato era que a mina estava cheia de ouro e isso rende à família uma fortuna incalculável. Kane, então, é tirado do convívio de seus pais e levado para ser educado por um grupo de empresários, que o moldam para a vida pública dos magnatas do poder.
Em sua velhice, Kane manda construir para si uma enorme e esplendorosa mansão, batizada de Xanadu, em homenagem à mítica cidade asiática, conhecida por seus poetas como a capital do prazer. É lá que, isolado de tudo e de todos, morre, deixando para os personagens do filme o enigma de sua última palavra.
O filme termina e ninguém revela o mistério de “Rosebud”. Somente ao espectador é revelado o significado da palavra, aos últimos segundos do filme, o que o leva à reflexão não durante, mas após o término do filme. A crítica tomou esta obra de Welles não só como um marco na história do cinema, quanto ao roteiro, filmagem e cenário, como a considerou mais tarde como o melhor filme da história do cinema de todos os tempos.
A trama em “Cidadão Kane” tem início com uma palavra: “Rosebud”. A mídia especula que tal palavra deva ter um sentido muito importante na vida do magnata, por ser justamente sua última palavra. A pergunta é: O que passara pela mente de um homem como Foster Kane, que teve tudo em sua vida, para pronunciar uma única palavra, tão misteriosa, em seu leito de morte?
Toda a vida de Kane é passada diante dos olhos do espectador e com isso, em toda sua vida pública, repleta de escândalos e luxo, em nenhum momento é demonstrado claramente o que a palavra “Rosebud” poderia significar, embora, para quem já tenha assistido ao filme, o vínculo com a palavra pareça mais claro.
Quase no fim do filme, o mordomo de Kane revela ao repórter investigativo que já ouvira uma vez Kane pronunciar a palavra, e o fora após um acesso de raiva, onde se depara com seu antigo peso de papel – que consiste em um globo de vidro com uma maquete de uma casa dentro, coberta de uma imitação de neve, e que conforme o globo é movido é promovido um efeito de neve dentro dele. O velho magnata o sustenta na mão e pronuncia: “Rosebud”. Em seu leito de morte, Kane está segurando novamente o globo, pronuncia sua misteriosa palavra, e suspira, deixando cair o globo, que termina por se quebrar no chão.
Nas últimas cenas, quando todos os objetos sem valor do magnata estão sendo incinerados, ao espectador é permitido conhecer o significado da palavra. Em meio aos pertences está um trenó, o mesmo modelo de trenó com o qual a criança Charles F. Kane estava brincando na neve, diante da pensão de sua mãe e é interrompido pelo empresário que o retira de sua família. A marca do trenó: “Rosebud”. Um operário pega o trenó e joga-o no incinerador. O trenó queima, é a última cena do filme.
Semanticamente, “Rosebud” se traduz do inglês por “Botão de Rosa”, e é uma referência poética clara ao órgão genital feminino do prazer: o clitóris. A anatomia da genitália feminina é frequentemente associada à forma de um botão de rosa pelos poetas. Assim, “Rosebud” simboliza aquilo que há de mais íntimo, de mais misterioso, mais escondido, mais particular, mais encoberto. Neste sentido, o autor Orson Welles reservou a palavra “Rosebud” para associar poeticamente àquilo que o personagem possuía de mais íntimo, de mais particular. “Rosebud” era o seu lugarzinho especial de prazer, onde só ele podia tocar, era seu refúgio particular onde ninguém, em toda sua vida conturbada, tinha acesso.
Por fim, vemos que “Rosebud” é imediata e simplesmente a marca do trenó de sua infância. Ou seja, o seu lugar íntimo especial é o último momento de sua vida em que o personagem é ingênuo. Lá, na neve, sendo retirado de sua família, não só sua brincadeira é interrompida, como também sua vida, sua infância. É lá onde tudo começa a se perder. O trenó é enterrado ali, e sua vida também. E então percebemos que ao homem que tudo teve, na verdade, tudo se perdeu. Kane, em sua vida, só perdeu, sua vida toda é uma perda, apesar de toda sua opulência. Sua vida é um absurdo, uma ironia. E a cena da neve nos mostra que o que Kane mais perdeu foi o rumo de sua vida, aquele é o ponto chave onde tudo começa a ser perdido. Os próprios personagens da trama indicam isto durante o filme: “Rosebud” foi aquilo que Kane mais perdeu.
E é através dessas declarações, e da manutenção pelo personagem do seu estimado peso de papel durante o filme, que vamos percebendo que “Rosebud” acompanha a mente de Kane em toda sua vida, até o fim. Em toda sua vida recheada de luxo, Kane é vazio, incompleto, porque ele perdeu sua vida. Ele lota sua vida material de coleções nostálgicas, sua mansão é um museu de seus desejos não realizados porque ele é vazio, e no fim tudo se perde.
A cena final é, na verdade, a cena principal do filme. Kane está morto, extinto, e seus objetos particulares também. Quando o espectador assiste, impotente, à queima do trenó, onde está a chave de todo o mistério ao redor do qual a trama gira, percebe que não só ninguém descobrirá jamais o significado da última polêmica do magnata como também que seu “Rosebud” é extinto junto com o personagem. A vida de Kane finalmente se foi por completo, e o trenó também. Tudo acabou, e o que realmente importava para o rico jornalista se extingue com ele para o esquecimento, para o nada.
Em “Cidadão Kane”, deste modo, Welles faz com que o espectador seja o grande privilegiado, porque só este descobre o verdadeiro sentido da vida de Kane, enquanto ninguém na trama jamais descobrirá. Isso também significa que é preciso estar fora da história para compreendê-la por completo. A vida só ganha sentido após a morte, mas não para os participantes da história, mas para o espectador, que é também o único a ser totalmente excluído da trama, e é por isso que ele está privilegiado. Aliás, quando o espectador assiste ao filme pela primeira vez ele ainda está participando da trama, em seu papel de espectador. Porém, o mistério só é revelado no final, quando a trama acaba, e o espectador só ganha o conhecimento quando o filme também já está consumado, junto com o personagem e seu segredo. Desse modo, o próprio filme, assim como o sentido da vida, só é revelado e só pode ser compreendido e refletido quando se está consumado.
Entre os inúmeros conceitos por ele deixado destaco um ? Objeto transicional.
O objeto está representando uma transição entre o mundo do imaginário e o da realidade consiste num travesseiro, num bico, ursinho de pano, um cobertorzinho, algum brinquedo, e ocupa um lugar e uma função no espaço transicional. A passagem do mundo interno e imaginário da criança para o mundo real processa-se por meio de uma espécie de ponte de transição entre ambos. O transito entre a fantasia e realidade possibilita alto potencial e riqueza de criatividade inclusive artística. Esse espaço consiste no fato que ele vivencia o seio da mãe como fazendo parte de seu próprio corpo.
A ligação e o afastamento do objeto transicional deixam em cada sujeito uma marca: fica na mente do indivíduo um espaço que assim como o objeto transicional, é intermediário entre o interno e o externo.
É nesse espaço que se produz muitas das atividades criativas do homem, como as artes, à música etc. que “representam” o mundo interno para o exterior e em certo sentido representa a realidade para si mesmo.
Pensamos que esse velho brinquedo ficou na memória de Kane como um objeto transicional, ou seja, iluminados pelo atendimento da teoria de Winnicott sabemos que alguns objetos ficam investidos de muito significado por passarem ser representantes para a criança de forma simbólica de uma ligação, de um período de vida, que a criança teve algo de muito significativo. No caso o trenó representando a própria ligação com os pais e o período que Kane foi de fato feliz.
Fontes:
- Dicionários
- O Homem de uma só banda